Nas alturas em que passamos mais tempo em casa, também podemos aproveitar para aprender sobre harmonização de cervejas. Não percas as sugestões da sommelière de cervejas Marta Fraga.

“A harmonização permite materializar a ideia de que o todo é mais do que a soma das partes. Se tivermos um prato agradável ao palato e uma cerveja igualmente agradável, estes dois elementos trarão uma experiência gastronómica muito mais rica e complexa se soubermos fazer a melhor ligação entre os dois.”

As palavras são de Marta Fraga, sommelière de cervejas da Super Bock, para quem a arte de harmonizar cervejas e alimentos permite responder à procura crescente de experiências gastronómicas interessantes. “Ao fazermos harmonizações conseguimos demonstrar a versatilidade e o poder democrático da cerveja”, defende, admitindo no entanto que “falar de harmonização pressupõe bastante conhecimento dos estilos de cerveja, da forma como eles são plurais, e também conhecimento sobre os alimentos, a sua preparação e a interação que têm entre si.”

Foi com este contexto em mente que pedimos à sommelière de cervejas que sugerisse cinco harmonizações que podes fazer em casa. Parte do trabalho está feito, agora é só leres e saboreares cada uma das sugestões.

 

#1 SALADA DE TOMATE COM ERVAS AROMÁTICAS + WEISS BIER

SALADA DE TOMATE COM ERVAS AROMÁTICAS

Esta harmonização permite um equilíbrio de forças entre cerveja e prato, nivelando a leveza de ambos. Destaque para as notas mais delicadas da cerveja, que entrega notas frutadas de banana, podendo também ter um carácter ligeiramente cítrico, o que torna o conjunto bem refrescante.

 

TIPO DE HARMONIZAÇÃO: COMPLEMENTO

A salada é, já por si, um prato onde a frescura dos vegetais e ervas aromáticas impera. Desta maneira, e para criar o complemento desejado, importa que a cerveja contribua na mesma medida para esta sensação refrescante, mas com elementos que não constem da salada. O equilíbrio é alcançado dadas as características frutadas da cerveja, que advêm principalmente do tipo de fermentação a que foi sujeita.

 

#2 CARNE GRELHADA + PORTER

CARNE GRELHADA + PORTER

Se pensarmos, por exemplo, numa carne de bovino grelhada, sabemos que traz notas tostadas ou de caramelização, dependendo do tempo que for deixada a cozinhar. Esta caramelização e torra pode ser replicada nas cervejas mais maltadas, em que os sabores do caramelo, tostados ou de frutos secos do malte podem estar igualmente presentes. É esse o caso de uma Porter.

 

TIPO DE HARMONIZAÇÃO: SEMELHANÇA

Nesta combinação procuramos encontrar o mesmo tipo de sabores e aromas tanto nos alimentos como na cerveja. É o tipo de harmonização mais fácil de conceber para quem começa, mas não por isso menos apelativo. E apesar de terem um ponto forte de sabor em comum nas notas tostadas e caramelizadas, a carbonatação contida em cada gole dado na Porter ajudará a preparar caminho para a garfada seguinte da carne grelhada, em que só conseguimos terminar quando se esvaziam prato e copo.

 

#3 COGUMELOS SALTEADOS + MUNICH DUNKEL

COGUMELOS SALTEADOS + MUNICH DUNKEL

Nos cogumelos salteados evidencia-se uma complexa e agradável combinação de notas terrosas e de sabores umami quando são confecionados. Neste caso, uma cerveja mais maltada, como uma Munich Dunkel, onde ecoam as notas caramelizadas e ligeiramente fumadas, será uma bela forma de acompanhar os cogumelos.

 

TIPO DE HARMONIZAÇÃO: CONTRASTE

 

O umami é um dos cinco sabores básicos (os outros sendo o salgado, doce, amargo, ácido), e foi identificado pela escola japonesa no início do séc. XX, estando presente em grande parte de carnes, peixes, molhos ou preparações de soja, algas, cogumelos ou queijos muito curados. Este sabor contrasta com o doce caramelizado e sabores torrados do malte que marcam a Munich Dunkel. Apesar de alimento e cerveja trabalharem em sentidos aparentemente opostos, numa harmonização por contraste esta dinâmica joga a favor da experiência de quem participa da prova.

 

#4 QUEIJO ROQUEFORT + IPA

QUEIJO ROQUEFORT

Neste queijo temos mais uma vez o sabor umami trazido pela sua cura e pelos fungos, muita untuosidade, algum sal, e muita intensidade de sabor. A IPA traz um teor alcoólico mais pronunciado (6,5%), e amargor, que competem com a gordura, além do lúpulo juntar ainda um caráter herbáceo, frutado ou mesmo cítrico. Todos estes elementos se complementam entre si, potenciando os cinco gostos básicos numa mesma harmonização.

 

TIPO DE HARMONIZAÇÃO: COMPLEMENTO

 

Pensando na etimologia de “complemento”, esta vem de completar em latim, que significa “completo”. É então uma harmonização que torna mais una, mais rica a combinação. A complementação faz uma ligação para lá do que é só semelhança ou só contraste, e é a base para esta experiência de degustação do intenso Roquefort, enriquecida pelos elementos frutados e de amargor que a IPA traz.

 

#5 BRIGADEIRO + STOUT

BRIGADEIRO + STOUT

O brigadeiro tradicional tem uma doçura intensa e uma cremosidade densa. É muito fácil de fazer, usando essencialmente leite condensado e chocolate, e liga particularmente bem com uma Stout algo encorpada, de nível alcoólico médio, onde reinam os maltes tostados.

 

TIPO DE HARMONIZAÇÃO: CONTRASTE

 

É preciso ter em conta que este tipo de harmonização tem uma maior complexidade, com interações específicas, ou seja, nem tudo contrasta com outra coisa. Sabemos que a carbonatação, o amargo, a acidez e o teor alcoólico são bons elementos para contrastar com a untuosidade doce de uma sobremesa. Neste caso, para contrastar com a doçura do brigadeiro, temos o amargor. Mas nem sempre precisamos de pensar no amargor do lúpulo, muitas vezes o amargor da torrefação, mais próximo do cacau ou café, pode ser mais eficaz para contrastar com o doce.